quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Teresa Pessoa



"Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada... "

Hoje somos só três no carro. O Tommy foi com o pai ao pediatra. A Té e o Ti vão estrategicamente posicionados junto às janelas. A bem da sua integridade física e da minha sanidade mental é necessário garantir uma distância de segurança entre os dois, geralmente ocupada pelo mano mais velho. À falta deste uso as mochilas como barreira.

O Ti está nervoso:

“Não acredito que vou chegar outra vez atrasado, mãe… já tocou há oito minutos…”

“Pede desculpa ao professor e explica que saímos mais tarde de casa porque o Tommy está adoentado.”

Suspira, com enfado:

“Levantei-me tão cedo… para nada…”

A Té sorri, maléfica. O desapontamento do irmão ilumina-lhe o rosto e aquece-lhe a alma, como um raio de sol a rasgar uma manhã cinzenta. Repreendo-a com um olhar severo através do retrovisor. O Ti continua a medir o atraso:

“Onze minutos…”

“Tem calma rapaz. Se estiveres atento recuperas o tempo perdido.”

“Eu estou sempre atento, mãe.”

“Fazes bem. Se queres ir, como dizes, para a ‘escola dos médicos’ tens de ser um bom aluno.”

“Sim, vou aprender muito e vou ser médico.”

Olho de novo, pelo espelho, para a Té:

“E tu, senhora, queres fazer o quê quando fores crescida?”

Os seus olhitos gigantes brilham antecipando uma resposta que não sei bem se quero ouvir. Arrisco, em todo o caso:

“Diz lá. Queres fazer o quê?”

“NADA!” – responde com uma gargalhada.

O Tiago olha-a, incrédulo, por entre as mochilas:

“Como é possível, Teresa? Vais andar tantos anos na escola para depois não fazer nada?”

Ela puxa a chupeta para o canto da boca e cantarola:

“Nada, nada, nada. Eu não qué fazê nada. Eu não vô fazê nada!”

Quanto mais o Ti lhe tenta explicar que ‘fazer nada’ não é objectivo de vida mais ela  ri e diz "nada, nada, nada". Quanto mais ela ri mais irritado ele fica. Antes de sair do carro ainda me força a chamá-la à razão:

“Estás a ouvir a Teresa, mãe? Não dizes nada?”

“Nada, filho. Já não digo nada. Sai do carro e corre, que já perdeste vinte minutos de aula. A Té vai depois, comigo. Tem tempo, está mais que visto.”


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